A criança se descobre andando. E que
incrível é o mundo de quem caminha sozinho! Penso que a sensação seja similar a
de quem dependia de companhia para sair de casa e pode sair sozinho, explorar o
mundo e viver por si as alegrias e os receios desta liberdade.
A criança neurotípica, desde pequena tem
uma forte curiosidade em relação ao mundo que tem em volta. Explora tudo usando suas aptidões motoras e
perceptivas e assim vai instituindo seu mundo através de ações vivenciadas: consegue
empilhar ou empurrar objetos, beber no copo, recolhe objetos e observa,
morde-os, pula, etc. É um período de desenvolvimento muito egocentrado e ela tem
uma maneira pessoal de se relacionar com as pessoas e o ambiente, pois sua
inteligência é vivencial, prática.
Sorri feliz ao juntar blocos, mostra
gostar de ouvir músicas e versos e de cantar, se balançar, dançar e bater
palminhas. Entre 1 ano e 1 ano e meio, muitas coisas vão sendo aprendidas, ela
ganha desenvoltura gradualmente e também começa a desafiar, testando reações,
buscando entender consequências de suas ações e lutando para ter seus desejos
atendidos.
Quanta novidade! A vida floresce em
descobertas e ela se vê maravilhada em meio a tantos estímulos. Cores, cheiros,
formas, texturas, tudo parece convidar ao toque, a provar o gosto e a esmagar
nas mãos.
Porém, ainda que cheia de curiosidade,
a criança tem baixa concentração e
costuma mudar de atividade a cada instante, pois está pesquisando, aprendendo e
desvendando coisas.Seu interesse e sua paciência para com uma descoberta se
esvaem assim que outra coisa a estimula.
Então pega a boneca para largá-la
assim que percebe um gatinho passando. Ali mesmo do outro lado da grade,
desiste do gato ao ver o graveto e assim vai bailando sua pureza no universo de
gostosuras do mundo.
Convém que tenha liberdade para
movimentar-se e estímulos para o seu completo desenvolvimento motor. Presa ao
carrinho ou ao colo, ela perde oportunidades de fortalecer as pernas, ganhar
destreza nos passos e equilíbrio. A curiosidade pelo entorno, serve tanto de
estímulo para andar, quanto para explorar texturas, pesos, objetos, cores,
sensações as mais variadas que possa encontrar. Contenha seu desejo adulto de evitar tudo,
permita que ela busque, explore, teste e eventualmente lide com uma
consequência ou outra. Cair, tropeçar, bater uma testa, são aprendizagens de
limites reais, ensinam também. Cuide no entanto para evitar perigos maiores,
pois ela não tem a menor noção de riscos.
A brincadeira deve ser a que usa suas
habilidades de exploração e suas habilidades motoras. Empilhamentos, colocar
potes dentro de outros potes, bater latas, tirar, colocar, lamber e provar, agregam conhecimentos a respeito dos objetos.
Rabiscar com lápis, giz, canetas hidrográficas
será uma fonte de diversão, descobertas e alegria, desde pouco menos de um ano
de idade. Mas cuide para que o espaço onde faça isso não seja causador de
estresse familiar. Planeje. Oriente, brinque também.
“No meio do caminho, tinha outra
pessoa... tinha outra pessoa e eu não consegui considerar!”
Pode ser este o jeito adulto de
perceber a fase egocêntrica infantil. A criança não consegue separar-se de seu
próprio ponto de vista, então não dá conta de reconhecer o outro e levá-lo em
consideração nas situações. Ela tenta adaptar o que está no mundo a si mesma, a
seus desejos e vontades. Isso gera situações problema, que muitos adultos tem
dificuldade de entender.
Como não consegue partilhar seus
objetos, mas arranca o objeto de outra criança “à força”, por desejar muito
tê-lo, pode ser erroneamente interpretada. Passa por briguenta, egoísta ou mal
educada. Mas ela não é capaz de conter os desejos e menos ainda de entender
porque não pode satisfazê-los. Cabe ao adulto ajudá-la nestas coisas com bom
senso e muito amor. Explicar muitas vezes, mesmo que ela não guarde as
informações. Carinho e amor ajudam a criança a desenvolver a compreensão, a
aprender a controlar suas respostas automáticas e ter mais harmonia nas
relações. Nesta fase, excesso de “não”,
cara feia, “colocar para pensar”, gritos, apenas criam medo, ansiedade e
respostas estressadas. Com afeto, carinho e firmeza, tudo se resolve melhor.Tudo
lento e gradual como deve ser.
Ao mesmo tempo em que aprende muito, a
criança testa a reação dos pais e se recusa a obedecê-los. Ela atira objetos e
fica observando a reação do adulto. Gosta de esperar o resultado. Se bem
conduzida, ela aprenderá que não deve atirar os objetos, que pode usá-los de
outras formas, basta mostrar a outra forma de maneira alegre e interessada. Ela
de pronto se interessa e muda de ação.
Nesta fase a criança necessita muito
do apoio, só assim ela desenvolve segurança. Ela brinca e interage com outras
crianças de forma limitada, primária. Água, areia, marcas, bolos, massinha, farão
sucesso com essa faixa etária. Mas brinque com ela, perto dela.
Os pais são a referência primeira e a
criança percebe o que eles sentem, mais do que eles dizem ( às vezes parece
saber a respeito da gravidez da mãe antes que lhe seja dito e comumente regride
em comportamentos que já havia superado, como voltar a fases de xixi ou falar como bebê ).
Tenta imitar seus pais em suas
atividades e maneiras de ser, o que fica divertido para quem observa. Formas de
sentar, de andar, de falar e de comunicar-se gestualmente, surgem inocentes nas
mãozinhas gorduchinhas desta idade.
Ser criança não é fácil, sente-se dependente
do adulto, precisa dessa proteção e busca ter ao alcance das mãos um objeto
familiar, que traz segurança e calma. Assim entra em cena o objeto de estimação
como boneco, urso, cobertor, chupeta, brinquedo, etc. Funciona como uma
transição entre o lar e a escola, o lar e a casa dos avós. O objeto representa
para ela todo o cuidado, afeto e segurança. Dormir abraçada a ele é como dormir no colo da
mãe. Perdê-lo pode ser um problema bem complicado!
Quando se é criança pequena, fica difícil
a separação da figura materna. Um afastamento provoca lágrimas e é preciso
certificar-se de que a mamãe voltará. Assim, as fases de adaptação na escola,
com babás, com a casa dos avós, podem ser regadas a bastante chororô até que se
sinta segura dos acontecimentos.
Ao mesmo tempo, o pequeno ser busca em
certos momentos uma maior independência, começa a manipular sozinha canecas e
colheres mesmo que derrube o suco e o alimento, pois ainda não consegue prever
as reações dos objetos. E eles reagem! Caem, viram, pesam!
E nesta dança encantada com a vida e
mundo, a criança inicia a construção de sua noção do EU, sua identidade, o
conceito de si mesma. Diferencia-se dos objetos e das pessoas, dá a largada
para perceber a ela mesma como um indivíduo. Repara no afeto, no carinho. Nota
como a tratam e deseja ser tratada com amor e afeto. E como tudo isso é
fantástico para criar a base de seu desenvolvimento social!
Mas nem tudo é simples. Criar rotina,
vir a organizar-se no espaço e nos vínculos afetivos cria angústias e “descompensações”.
Reações de tristeza, raiva, irritabilidade, serão importantes e aparecerão
assim que perceber as primeiras noções de ordens e limites. Mais uma vez o
carinho, o afeto será o norteador do que “pode” e “não pode”, pois que a mesma
pessoa que acaricia fala “não” e isso é um grande aprendizado para o ser humano
em formação.
Tantas são as mudanças! Higiene
corporal também se torna um foco nesta idade. Treinar usar o banheiro, desafiar
sujar as roupas, idas e vindas de xixi nas calças serão normais e esperados.
Como importa que os adultos esperem que esteja apta emocionalmente e
fisicamente para este tipo de mudança de rotina! Qualquer investida precoce,
pode adiar por muito tempo o sucesso do desfralde.
A criança pequenina tem muito a elaborar.
Muitas experiências novas, podem trazer agitação para o sono, pesadelos e
dificuldades de ficar longe dos pais.
Um ou outro acesso de fúria, uma
intensidade de sentimentos de amor e de raiva podem assustar quem não esta
preparado para sua delicada criança virar um monstrinho eventual. Neste momento
é que se espera que o adulto seja “continente” e tranquilize o pequeno. Um abraço, um colo que acalma,
palavras em voz baixa e acalentadora podem ajudar muito. A raiva parece de
gente grande, mas ela não é grande, não esqueça! Cuidado para não exigir de sua
criança uma reação que ela não tem como oferecer.
E lembremos da chegada da linguagem verbalizada! De poucas
palavras, em um ano ela irá ampliar duas, dez vezes o vocabulário. Começa com
pequenas sílabas e logo frases telegráficas surgem e em breve você tem um
tagarela dentro de casa. Cante, converse, repita palavras. Ela agradece!
Na fase entre um ano e meio e dois
anos, a rebeldia, a instabilidade emocional, são normais e frequentes. Um
turbilhão de emoções cascateia, ela sente medo, raiva, ansiedade e os pais e
adultos que a cuidam precisarão de muita, muita paciência! Ela é ativa, xereta,
mexe em tudo, quer fazer tudo por si mesma. É cansativo cuidar desta criança,
então prepare-se para isso. Pessoas despreparadas acabam perdendo o controle,
batendo, agredindo a criança por ela ser apenas o que consegue ser aos dois
anos. Essas atitudes plantam raízes profundas e criam base para reações e ataques
agressivos futuros. Então respire, saia de cena se preciso, mas resolva as
situações, as birras, os ataques de irritabilidade com calma e lembre-se, não são
um ataque pessoal a você, são apenas traços novos de desenvolvimento e vão
passar! Plante o seu afeto, limites claros e amorosos e colherá um ser humano
equilibrado.
Bons ventos!
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